Diante da realidade machista que
predomina na agricultura e que invisibiliza o trabalhos das mulheres, o Centro de Tecnologias Alternativas (CTA) elaborou um instrumento de mensuração da
renda dos quintais, conhecido como “Caderneta Agroecológica”. Durante a
execução do projeto “Mulheres e Agroecologia em Rede”, o instrumento foi distribuído
para mais de mil agricultoras do país e parte da sistematização dos
acompanhamentos técnicos que aconteceram, entre 2014 e 2015, na Zona da Mata
mineira e no Sertão do Pajeú (PE) foram apresentados em um seminário em Mário
Campos-MG, nos últimos 26 e 27 de novembro.
Em Minas Gerais, 64 agricultoras
de 14 municípios foram acompanhadas pelo assessor técnico do CTA, Guto Lopes.
Já no nordeste, o levantamento envolveu 141 mulheres, de seis municípios, e ficou
ao encargo da articuladora da Rede de Mulheres Produtoras do Pajeú, Apolônia
Gomes. Os resultados quantitativos e qualitativos do instrumento abrem
precedentes para a qualificação do debate acerca das políticas públicas
voltadas para as mulheres rurais, comprovando a renda gerada na produção usada
para o autoconsumo, venda, trocas e doações.
As agricultoras Maria da
Conceição Caetano (dona Lia) e Márcia Donato, de Diogo de Vasconcelos-MG, participaram
do seminário contando de que forma o registro da produção contribuiu para o
fortalecimento dos seus trabalhos. A dona Lia relata que
sempre cultivou alimentos e “se fosse comprar verdura todos os dias nem tinha
como, porque somos treze pessoas em casa. Hoje a gente vê que está produzindo o
próprio cardápio da gente, de uma forma saudável, sem agrotóxico”. Já a Márcia
destaca que colocar preço foi fundamental para ela mesma valorizar o quintal: “tudo
o que a gente produz tem um valor e antes a gente não fazia a conta dele”.
Para a pesquisadora Maria
José Nogueira do grupo de pesquisa Estado, Gênero e Sociedade da Fundação João
Pinheiro, a caderneta tem uma potencialidade imensa por possibilitar se pensar
as relações de gênero no ambiente doméstico, a partir da escuta das mulheres. A
ideia é que haja uma parceria entre as organizações para consolidar a
sistematização dos dados.
A coordenadora geral de
Organização Produtiva e Comercialização da Diretoria de Políticas Públicas para
Mulheres Rurais e Quilombolas (DPMRQ/MDA), Michela Calaça, também
elogiou a iniciativa, afirmando que “pela primeira vez, a gente vai ter um dado
concreto do que sempre a gente falou no discurso e na política. Isso é chave
para conseguirmos destravar algumas coisas no Estado. No que se refere a trazer
o modelo agroecológico concreto, a caderneta faz isso, a partir do olhar das
mulheres”.
A
expectativa é que a caderneta seja aprimorada e ampliada para agricultoras das
cinco regiões do Brasil e influencie a criação de políticas públicas voltadas
para as mulheres rurais, em reconhecimento à dedicação delas na manutenção de
uma imensa diversidade de sementes e de saberes, bem como na garantia da
segurança alimentar, da saúde e da geração de renda para as famílias.
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