A equipe do projeto “Mulheres e
Agroecologia em Rede” se reuniu na tarde desta terça-feira (28/10) para debater
as metodologias do terceiro e último módulo do Programa de Formação Feminismo e
Agroecologia (PFFA) da região Sudeste. O próximo PFFA vai acontecer no Centro
de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata (CTA-ZM), entre 10 e 12 de
novembro, e contará com a presença de agricultoras do Rio
Doce, Norte e Leste de Minas, Região Metropolitana de Belo Horizonte, Vale do Jequitinhonha,
São Paulo, Rio de Janeiro e extremo Sul da Bahia.
“Economia Solidária,
Economia Feminista e Políticas Públicas” é a temática escolhida para ser
aprofundada no terceiro módulo, em continuidade às discussões levantadas sobre
“feminismo e agroecologia como projeto de sociedade” e “auto-organização e participação das mulheres”.
As dinâmicas de trabalhos estão sendo pensadas para facilitar as abordagens e
garantir um maior aproveitamento da formação.
Quer acompanhar o
que aconteceu no módulo anterior, conhecer as metodologias utilizadas e as impressões das participantes? Confira a matéria do segundo PFFA Sudeste:
Agricultoras discutem organização e autonomia das mulheres
O segundo módulo do Programa de
Formação Feminismo e Agroecologia (PFFA) da região Sudeste aconteceu no Recanto
São José, em Belo Horizonte. Participaram da formação aproximadamente 35
mulheres, dentre elas técnicas e agricultoras agroecológicas de Minas Gerais,
São Paulo, Rio de Janeiro e extremo Sul da Bahia.
Várias atividades fizeram parte da
metodologia de trabalho do PFFA, que envolveu desde dinâmicas em grupos, até
momentos lúdicos e culturais, para a facilitação da troca de
conhecimentos. Foram compartilhadas as experiências das Oficinas de Multiplicação
e o andamento da Caderneta Agroecológica nas comunidades das participantes. Uma
das atividades de multiplicação que aconteceu abordou a temática “gênero,
produção e geração de renda”, no município de Turmalina-MG, organizada pelo
Centro de Agricultura Familiar Vicente Nica (CAV). A matéria sobre a
atividade se encontra no site da organização.
Os mapas da
sociobiodiversidade das propriedades rurais foram aprofundados neste módulo. As
participantes foram convidadas a colar adesivos referentes à participação feminina e masculina nos espaços produtivos da família. A agricultora e
presidente da Associação “Flores da Terra” de Itahém (BA), Miralva Ferreira,
destacou a importância da atividade: “Ficou bem claro que a mulher está à frente
dos trabalhos. Os homens concentram-se nas lavouras, mas dentro de casa, a
gente viu que são poucos que ajudam as companheiras. Foi importante para a
gente despertar e começar a fazer mudanças na nossa casa.” A técnica do CAV de
Turmalina (MG), Joelma Soares de Souza também comentou sobre o mapa: “Eu acho
que a divisão sexual do trabalho ainda é muito forte. A gente percebe que as
mulheres estão muito sobrecarregadas, porque as mulheres estão nos espaços
‘ditos’ dos homens, mas os homens não estão inseridos nos espaços ‘ditos’ das
mulheres, principalmente nas atividades domésticas. Então traz uma mensagem
muito forte para a gente de que é preciso discutir o papel do homem e da mulher
na sociedade”.
Foram feitas visitas de intercâmbio em
duas experiências agroecológicas urbanas que são assistidas pela Rede de
Intercâmbio, de Belo Horizonte, na região conhecida como “Baixo Onça”. As
visitas despertaram o interesse das participantes e contribuíram para a troca
de conhecimentos entre as agricultoras. Um pouco do que aconteceu pode ser
conferido através do Podcast sobre este intercâmbio
agroecológico.
O "Cigarras Cantoras", coral
composto por mulheres educandas de EJA, Educação de Jovens e Adultos, fez uma
belíssima apresentação na noite do segundo dia de formação. Depois da
apresentação, houve uma roda de conversa com as participantes, momento no qual
se pode conhecer melhor a trajetória do coral e perceber identificações entre
as histórias de vida das coralistas e das agricultoras do PFFA. Em seus
depoimentos, algumas educandas ressaltaram a importância do coral, frente ao
excesso de atividades domésticas atribuído às mulheres. Um pouco da
apresentação pode ser vista no vídeo:
A construção dos mapas das organizações
foi uma metodologia utilizada para verificar em quais espaços e cargos as
mulheres estão presentes nas instituições nas quais trabalham. Ilzete Rodrigues
de Lima, do Centro Agroecológico Tamanduá (CAT) de Governador Valadares,
comenta a importância deste tipo der reflexão: “Neste módulo eu achei
interessante a gente estar aprofundando a questão do feminismo. No mapa das
instituições verificamos quem está ocupando os cargos mais importantes e também
número de participação das mulheres. A maioria dos espaços decisórios ainda
está sendo coordenada pelos homens, as mulheres se concentram em cargos
administrativos, na secretaria, mas não em coordenações.”
Miriam Nobre, militante da Marcha
Mundial de Mulheres, comentou a tensão vivida dentro das organizações quanto ao
esforço de estimular e fortalecer processos autônomos para mulheres. “Incomoda
demais, nas organizações, as reuniões específicas para as mulheres. Não é só
trabalhando em projetos mistos que construiremos nossa autonomia. Precisamos
pensar como construímos internamente os processos, como pautamos recursos
específicos para as mulheres”.
Germana Platão Rocha, agrônoma e
técnica do Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (CAA),
exemplificou formas naturalizadas de machismo dentro das organizações: “Já é
esperado que é a mulher quem vai fazer uma intervenção questionando a presença
feminina nas reuniões, porque não é lembrada a pauta sobre a mulher, por parte
dos homens. A mulher só é lembrada quando é para ir para a cozinha ou para a
limpeza. Quando as mulheres são convidadas, geralmente são escolhidas para
sistematizar as informações das reuniões. Fica parecendo que só os homens têm o
poder de falar, de representar. As mulheres ficam reprimidas com isso. Por que
o homem pode viajar, mas a mulher não pode, em função dos filhos ou porque tem
alguma coisa para fazer em casa?”
Para a superação dos desafios
vivenciados pelas mulheres, foram encaminhadas algumas ações a serem
continuadas nos municípios das participantes entre os módulos de formação. As
estratégias de preparação das oficinas de multiplicação e acompanhamento da
Caderneta Agroecológica foram pensadas nos grupos de trabalho e socializadas
pelas mulheres.
Quem participou do PFFA voltou para
casa com ânimo renovado para avançar na construção de relações mais justas
entre homens e mulheres. Maria Aparecida Lopes de Oliveira Passos, do Norte de Minas, ressalta o valor do
PFFA para o povo indígena Xacriabá: “Essa formação está sendo muito importante,
porque a gente está discutindo sobre o feminismo, sobre a valorização da
mulher. Precisa muito desta discussão na minha comunidade. Pela nossa cultura
Xacriabá, temos a educação de que só os homens podem falar e podem fazer. A voz
da mulher é sempre depois da dos homens. Depois de a gente estudar muito,
viajar muito e ter outras experiências com outros povos, muitas já estão
convencendo os homens que as mulheres têm direitos iguais, podemos ter voz.
Mesmo que eles digam não, nós podemos dizer sim. A gente está cada vez mais
adquirindo experiência com outras mulheres e percebendo a importância do
trabalho das agricultoras ser reconhecido, trazer de volta uma renda familiar.”
O segundo PFFA Sudeste aconteceu entre
8 e 10 de setembro, como parte das atividades do Projeto Mulheres e
Agroecologia em Rede. Mais fotos do módulo podem ser encontradas no álbum da Formação.
O projeto tem apoio da União Européia e conta com a
participação de várias organizações que trabalham com mulheres e agroecologia
em todo o Brasil, são elas: Rede de Mulheres Empreendedoras Rurais da Amazônia,
Rede de Produtoras Rurais do Nordeste, Movimento de Mulheres Camponesas, GT
Gênero e Agroecologia, GT Mulheres da ANA, Movimento de Mulheres da Zona da
Mata e Leste de Minas Gerais e o Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da
Mata (CTA-ZM).
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